quinta-feira, janeiro 31, 2008

Ensemble C'est tout, de Claude Berri (2007)

"Enfim Juntos"

De França chega-nos uma história pouco convencional, uma lufada de ar fresco para combater tantas comédias românticas e afins que têm aparecido nas nossas cinzentonas salas de cinema, filmes esses que nada acrescentam e até entediam. Nesta história cruzam-se os destinos de Camille (Audrey Tatou), artista frustrada, de costas voltadas para a sua familia, e que ganha a vida a fazer limpezas; Franck (Guillaume Canet), um jovem incompreendido, cozinheiro a tempo inteiro, e cujo o único dia de folga é passado com a avó doente, Paulette (Françoise Bertin), que tudo lamenta nos seus derradeiros anos de vida, e há ainda o sui generis aristocrata Philibert Marquet de la Tubelière (Laurent Stocker), homem angustiado, timido e gago, com aspirações ao mundo do teatro. A originalidade desta história está na forma como as vidas destas pessoas se cruzam, e estabelecem um relacionamento que à partida seria improvável. Sem cair excessivamente em lugares comuns típicos, é um filme com uma narrativa muito própria, que não nos revela logo tudo à partida, nem sequer nos contextualiza previamente, desdobrando-se minuto a minuto, pondo a descoberto as caracteristicas de cada personagem, na sua individualidade, mas também e essencialmente, nessa referida interacção atípica. De resto, nunca chegamos muito bem a perceber de onde vêm estas personagens e qual a sua história, apenas percebemos que chegaram a um ponto da sua vida em que urge fazer alguma coisa para mudar e dar o salto.

O filme acaba por debruçar-se sobre o empurrão que estas pessoas precisavam. Há, contudo, aspectos que gostariamos de ver melhor explorados. A dada altura a relação entre Camille e Franck apodera-se de quase toda a acção, deixando em plano secundário as vidas das restantes personagens, nomeadamente a de Philibert, talvez a personagem mais rica do filme. Há também o final, que se podia ter ficado pela penúltima cena. Se tão pouco sabiamos da vida anterior destas personagens, também não tinhamos de ficar a saber tanto da sua vida futura, e infelizmente a forma como o filme termina, fazendo jus ao título português do filme (enfim juntos), obedece aos tais clichés que o filme conseguiu evitar quase sempre. O que é pena. Ainda assim, apesar de ligeiro, este é um filme de grande densidade emocional, apelando claramente a uma reflexão profunda da nossa forma de estar e interagir com os outros. Ainda que as decisões finais sejam individuais, é em interacção que as encruzilhadas e dilemas com que nos deparamos no dia-a-dia, se simplificam e se tornam passíveis de ser ultrapassados.

segunda-feira, janeiro 28, 2008

The Magnetic Fields - Distortion

Novo álbum dos Magnetic Fields, numa vertente mais pop. Destaque para as músicas "three way" e "california girls". É dificil tirar este álbum do ouvido.

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quarta-feira, janeiro 23, 2008

4 meses, 3 semanas e 2 dias, de Cristian Mungiu (2007)

O cinema romeno está na moda, ou pelo menos assim parece, dada a recente proliferação do mesmo nas nossas salas de cinema. Após as recentes projecções de "A Morte do Sr. Lazarescu" e "12:08 A Este de Bucareste", chega-nos agora este "4 meses, 3 semanas e 2 dias" do realizador Cristian Mungiu, vencedor da Palma de Ouro em Cannes, o ano passado. A acção do filme, passa-se, no entanto, 20 anos antes, em 1987, nos últimos tempos do comunismo romeno, numa altura em que o aborto era proibido às mulheres com menos de 40 anos. Trata-se de um filme cru, frio e duro, que nos remete para uma realidade igualmente cruel, o aborto clandestino. Sem moralismos ou juízos de valor (não é esse o objectivo do filme), o realizador encaminha-nos para uma representação demasiado real desse processo. De salientar a forma notável como no decorrer do filme, o acto em si é colocado como mais uma tarefa a realizar nesse dia, sem grandes momentos para reflexão, sem floreados, o que denota bem como o aborto clandestino estava extremamente enraízado no quotidiano destas pessoas. O mundo não para, há que continuar a frequentar a escola, a ir a um jantar de aniversário, enquanto se ajuda (ajuda que vai para além do mero apoio moral) a amiga que está no hotel à espera que se dê o desmancho. Vivia-se numa sociedade em que todos os gestos eram controlados, todas as acções suspeitas e cada qual tentava sobreviver num clima de repressão social. Este é um filme em tempo real, daí que só paremos para respirar quando as protagonistas também respiram, vemos o mesmo que as personagens veêm, da mesma forma que não fazemos a minima ideia como o filme vai acabar tal como elas não sabem como acabará esse dia. Apesar de ser um bom filme, está, quanto a mim, sobrevalorizado, o que advém claramente do rótulo adquirido pelo prémio em Cannes.

terça-feira, janeiro 22, 2008

Cats on Fire - "The Province Complains" (2007)

O ano musical começa bem. Recentemente descobri uma banda nitidamente influenciada pelos Smiths, que fizeram um delicioso álbum em 2007. São finlandeses e arriscam-se seriamente a seguir as pisadas de Morrissey e companhia.

Aqui fica a música "Draw In The Reins" para abrir o apetite:

http://www.myspace.com/catsonfiremusic

sábado, janeiro 19, 2008

The Go Team! @ Lux-Frágil 18/01/2008

Do It, Do It, Allright!

E eis que os Go Team encheram a pequena sala de concertos do Lux para, com a sua excentricidade, colocar cerca de 600 pessoas a dançar valentemente. Ecléticos, barulhentos, saltitantes e bem humorados, os Go Team sabem, sem dúvida, aquecer uma sala. Lamentavelmente o concerto durou apenas pouco mais que uma hora, o que é pouco, para uma banda que é capaz de nos deixar a dançar a noite toda. Nota negativa para o som da sala (demasiado alto para uma sala daquelas dimensões), o preço dos bilhetes (20euros) e o potentissimo ar condicionado.Os Go Team provam ser uma banda nitidamente vocacionada para festivais. Proponho uma permuta: Arcade Fire num Coliseu, e The Go Team num dos próximos festivais que se avizinham.

terça-feira, janeiro 15, 2008

Cassandra`s Dream, de Woody Allen (2007)

Mais um ano, mais um filme de Woody Allen, que já nos habituou ao seu filme anual. Se por um lado, os verdadeiros fãs não podem passar sem esse momento anual, por outro, pode não ser positivo para a sua obra realizar um filme por ano. Deixemos de lado essa aparente tentativa de bater um qualquer record, a verdade é que um filme de Woddy Allen, a meu ver, continuará sempre a ser um acontecimento, ainda que este "O Sonho de Cassandra" seja apenas um filme bom. Esta é uma obra na qual o realizador retoma a temática do crime e castigo, e dos dilemas morais que atormentam quem se torna um assassino. Regressa igualmente ao crime enquanto garantia de ascensão social, divagando novamente pela oposição existente entre diferentes classes sociais e as oportunidades díspares que normalmente estão associadas a cada uma das posições na sociedade. Vem, pois, na senda de "Crimes e Escapadelas" e do mais recente "Match Point". Este filme conta-nos a história de dois irmãos (interpretados por Ewan McGregor e Colin Farrel), oriundos de classe média baixa, que não estando satisfeitos com a vida que levam, aceitam cometer um crime, como passaporte para uma vida melhor. O sotaque britânico continua a assentar como uma luva na obra do realizador, o argumento é um pouco requentado, mas as interpretações sao consistentes e há momentos verdadeiramente únicos. Ainda que o fim do filme, seja um pouco despachado, o que já vem sendo típico (mas outra coisa não seria de esperar, dada a inspiração nas tragédias gregas), são cerca de 100 minutos muito bem passados, acompanhados pela música de Phillip Glass, que sem dúvida contribui muito para o bom desempenho do filme. Fica, no entanto, a questão: irá Woody Allen, com a mudança para Barcelona, novamente com Scarlett Johansson, e com o contributo de Penelope Cruz, dar uma nova volta na sua carreira? Esperemos que sim.

sábado, janeiro 12, 2008

Shout Out Louds vs The Cure

Já alguém reparou na música do novo anúncio da Optimus? Pertence a uma banda sueca de nome Shout Out Louds e nao pude deixar de reparar como são influenciados pelos The Cure (com as devidas diferenças, claro). Bom, mas isto vem a propósito da vinda dos Cure a Portugal, o mês que vem.

Tonight I have to leave it- Shout Out Louds



The Cure-Friday I'm in love

quarta-feira, janeiro 09, 2008

Eastern Promises - Promessas Perigosas

David Cronemberg (2007)

O cinema de David Cronemberg é naturalmente um cinema negro, depressivo e que extravasa pouca felicidade. É também um cinema cru, de violência por vezes extrema e angustiante. As personagens dos seus filmes são normalmente almas deambulantes e ambivalentes, que procuram o prazer através de métodos pouco ortodoxos. Foi assim com "Crash" e mais recentemente com "Uma História de Violência". A história deste filme é mais linear que os anteriores filmes do realizador. Ainda assim, há um enigma latente, que é perceber se a personagem interpretada por Viggo Mortensen (mais uma vez a trabalhar com Cronemberg) é do bem ou é do mal. Trata-se de um filme que nos remete para os meandros da máfia russa em Londres, dos seus negócios de fachada e das suas actividades obscuras. É também um filme onde o conceito de família está muito presente, quer na sua forma tradicional (sangue do mesmo sangue), quer no seu formato fabricado (os tentáculos da máfia). O mote é a morte de uma prostituta russa no momento em que dá a luz, e o interesse em descobrir a família da criança, que leva a enfermeira interpretada pela actriz Naomi Watts a dar de caras com a máfia. Ainda que piscando o olho ao mainstream, Cronemberg diferencia-se pela capacidade de não cair no óbvio. O final do filme acaba por ser surpreendente, num filme com um elenco muito bom.

domingo, janeiro 06, 2008

Dirty Habits

Como todos os assuntos num país pequeno são tratados até à exaustão, já não tenho paciência para falar mais deste assunto. Mas não resisti a colocar aqui esta foto, que encontrei ali.

sábado, janeiro 05, 2008

Dexter

RTP2, 30/01, 22:40

Boa notícia de início de ano televisivo. Dia 30/01 estreia Dexter, na RTP2 às 22:40. Actualmente passa no canal cabo FX. Mais uma série com a chancela do canal americano Showtime (o mesmo de Weeds - Erva). Com Michael C. Hall, o cangalheiro gay de Sete Palmos de Terra, no papel de um analista forense com tendências assassinas. A interpretação do actor está excelente, o enredo precisa de ganhar fôlego, mas é de consumo obrigatório. Além disso Michael Cuesta, realizador de alguns episódios de 7 Palmos de Terra e dos filmes "LIE" e "Twelve and Holding" é produtor executivo, o que só por si garante a qualidade visual da obra.

Aquando da promoção da série no canal FX foi usada uma versão de "Psycho Killer" dos Talking Heads. Aqui fica o original desta viciante música.

sexta-feira, janeiro 04, 2008

Intimidade - Interiors, de Woody Allen (1978)

Por norma associamos Woddy Allen à comédia, precisamente porque esse é o seu registo habitual. Contudo para se ter noção da grandiosidade da obra deste artista, não podemos ignorar alguns marcos históricos da sua carreira, na vertente dramática, como é o caso de "Intimidade". Filmado depois dessa obra prima que é Annie Hall, e ainda com Diane Keaton no elenco, Intimidade é um drama intenso, extremamente denso e claustrofóbico, filme no qual se debruça pela tão sempre questionada condição humana. Uma família em crise, com o divórcio de um casal de terceira idade com 3 filhas adultas, obriga a uma mudança de comportamento desta família, a necessidade de comunicarem, ou põe a nú precisamente essa incapacidade. Woody Allen deixa-nos entrar na complexa teia de relações desta família, que viveu constantemente com coisas para dizer, que ficou sempre com atitudes e decisões por tomar. Por vezes é necessário um grande acontecimento para que toda uma família se reúna e se analise. É também o momento ideal para que cada um reflicta sobre si próprio e sobre o sentido da sua vida. É também neste tipo de filmes que Allen se aproxima estilisticamente de Bergman (de quem é confesso fã). Afinal o purgatório existe.

quarta-feira, janeiro 02, 2008

Lei do tabaco, uma opinião

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.
Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem, se algum houve, as saudades.
O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.
E, afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto:
Que não se muda já como soía.

Luís de Camões

Desde 1 de Janeiro que é proibido fumar na restauração, locais públicos, transportes, áreas comerciais e culturais, etc. Este é um assunto que está longe de estar arrumado, a procissão ainda agora vai no adro. E o facto do responsável máximo da entidade que fiscaliza as áreas comerciais e de restauração (ASAE) ter sido fotografado no dia 1 de janeiro a fumar num casino, também não ajuda. Também é certo que a proibiçao pura e dura, sem qualquer tipo de sensibilização ou acompanhamento dos principais visados não é correcta, e é comum dizer que o fruto proibido é sempre o mais apetecido, principalmente num país pouco habituado a cumprir regras. Mas sejamos razoáveis. Argumentos como os que tenho ouvido, sobre tratar-se de um atentado à liberdade individual ou que em cada um de nós nascerá um PIDE, parecem-me exagerados e reflexo de um raciocinio muito arcaico. Porque é que estas mesmas pessoas não se importaram de respeitar um pouco mais a liberdade dos que não fumam, até agora. Porque é que é tão consensual que não se fume em transportes públicos e áreas culturais, e se critique tanto a abolição do tabaco na restauração e nos centros comerciais? O princípio deveria ser o mesmo, o respeito pelos outros que escolheram não fumar, e é pena que seja necessário uma lei deste género para que esse respeito seja lembrado. Obviamente que o interesse do Estado não é que as pessoas deixem de fumar, e já estamos cá há tempo suficiente para saber que de boas intenções está o inferno cheio, mas não vale a pena fazer desta situação um drama. Bem sei que nos tempos que correm, para alguns, fumar é uma das únicas formas de evasão do espírito a que têm acesso, mas quem conseguir, aproveite para deixar de fumar, sempre poupa uns trocos. Quem não conseguir, aproveite para conviver mais ao ar livre, fazer mais compras nas zonas de comércio nao fechadas, e quem sabe até contribuir para que haja mais esplanadas, mais gente nas ruas e mais quiosques onde possam beber o cafezinho. Que fique bem claro, como costumo dizer, que não tenho nada contra fumadores, até tenho amigos que são, mas da mesma forma que durante anos muitos se calaram, conformaram e tentaram viver com a adversidade, está na hora de outros fazerem o mesmo, e não há de ser um sacrificio assim tão grande...! Pena que as pessoas não se juntem para reivindicar direitos muito mais importantes e imprescindíveis.