Em Janeiro de 2004, referi aqui o que Eduardo Prado Coelho no jornal Público sentenciava: "Mas também o Quarteto decaiu e se tornou um lugar inóspito onde quase ninguém se lembra de ir". Não podia estar mais certa a visão deste cronista, entretanto falecido. Recentemente voltei ao Cinema Quarteto, e deparei-me com um cenário no mínimo caricato. O Cinema Quarteto é o que considero um cinema fantasma. Neste momento a programação é constituida por filmes repetidos, de alguma qualidade, e em alguns casos passam pouco tempo depois da estreia, ou quando ja não se apanham em nenhuma outra sala, o que até considero positivo. Considero até que faz todo o sentido existir um cinema de repetições (antigamente Lisboa tinha vários cinemas de reprise, onde normalmente o povo via os filmes a preço acessível, já que as grandes estreias no Tivoli, Condes, Odeon, Eden, eram quase sempre para a elite). Contudo, não podia estar mais decadente, embora o atendimento até tenha sido exclusivo. O mesmo senhor que me vendeu o bilhete, foi quem projectou o filme. A sala estava vazia, e acabou por ser um previlégio o visionamento de um filme desta forma. O preço do bilhete parece-me demais, 4 euros, mas até entendo que haja custos a suportar. O bar estava fechado, provavelmente por ter sido um dia de semana à tarde, mas não tenho a certeza que abra à noite.
Mas há algo de único no Quarteto, um certo glamour decadente, como lhe chamaram aqui. São os posters vintage nas paredes, os acessos às salas, feitos via estreitas escadas, que por vezes subimos e descemos às escuras, as películas que já estão gastas, o cheiro a mofo, as cadeiras vermelhas já muito usadas e até os bilhetes antigos e em escudos (não sei se é assim intencionalmente, para dar um ar de revivalismo kitch ou porque a máquina é mesmo antiga). Foi um cinema de autor e de filmes de vanguarda (como se refere aqui), criado no pós 25 de Abril. É uma pena ver este cinema morrer. Por um lado a sua localização não é das melhores. Não se passada nada na Av. EUA, entre a Av. de Roma e Entre-campos, não há esplanadas, cafés ou comércio, só vai para aqueles lados que vive lá. Por outro lado, o Quarteto nos últimos anos, sempre teve dificuldade em competir com outras salas, o que advém do facto de muitos produtores serem igualmente distribuidores e até proprietários de cinemas (como é o caso da Castello Lopes). Ainda recentemente, as salas do Quarteto eram requisitadas para festivais e ciclos de cinema: Semana do Cinema Espanhol, Festival de Cinema Gay e Lésbico, Cinema Fantástico - Inatel, maratonas de filmes por altura de aniversário... hoje, pelo que me contam, até há sessões que atrasam porque há salas alugadas a entidades que nada têm a ver com a Sétima Arte (ao estilo cinema Império, se é que me estão a entender...). Alguém que pegue naquilo antes que seja tarde! Que bom seria poder ver lá, de forma regular, filmes que por exemplo tivessem passado em festivais como o Indie Lisboa, Doc Lisboa, Fantasporto ou Festroia, e para os quais há público. Talvez um dia...
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